TRILHA DE FINANÇAS

Economista Gabriel Zucman propõe que bilionários paguem pelo menos 2% de impostos sobre suas fortunas anualmente

Gabriel Zucman defendeu necessidade de um imposto global sobre grandes fortunas para fortalecer coesão social e a própria democracia. Sistema atual permite que mais ricos paguem pouco ou quase nenhum imposto.

29/02/2024 17:07 - Modificado há 5 meses
Economista, é referência mundial no tema, afirmou que não é necessário que todos concordem para que a taxação dos super-ricos seja implementada. Crédito: Kelly Fersan/MF

Se implementada, a medida teria o potencial de destravar 250 bilhões de dólares adicionais em receitas com impostos. O mais impressionante é que este valor extra seria gerado, hoje, com a taxação mínima de 2% aplicada sobre um grupo restrito de 3 mil bilionários, um indicador da concentração de riqueza e da necessidade de um sistema mais equitativo que, na visão do economista, ajudaria no fortalecimento da coesão social e da democracia.

Zucman saudou a iniciativa do Brasil que, na presidência do G20, trouxe pela primeira vez o tema para a mesa de negociação das maiores economias do mundo. “A liderança do Brasil ao introduzir esse tópico impulsiona um desenvolvimento histórico”, afirmou o economista de 37 anos, que também é diretor do Instituto Europeu de Tributos.

A melhor maneira de resolver o problema da “regressividade no topo da distribuição” ou, em outras palavras, mais ricos pagando menos impostos enquanto os mais pobres pagam mais, proporcionalmente, é criar um padrão mínimo para países taxarem os super-ricos, o que evitaria uma guerra fiscal entre países. 

E por que taxar as fortunas se já existe o Imposto de Renda? De acordo com Zucman, a noção de renda não é bem definida, enquanto a de riqueza é.  No caso brasileiro, por exemplo, um cidadão assalariado paga Imposto de Renda mensalmente, por meio de retenções na folha de pagamentos, enquanto os mais ricos têm como reduzir ou simplesmente não pagar impostos valendo-se de assessoria jurídica e ou tributária.

Já o conceito de riqueza, especialmente a dos bilionários, segundo Zucman é bastante mais claro. Ele destaca que há boas informações sobre o valor das empresas que os super-ricos possuem, muitas delas listadas em bolsas de valores. E mesmo quando essas empresas não são de capital aberto, é possível estimar o quanto elas valem pela simples comparação com companhias do mesmo porte e área de atuação que têm ações negociadas em bolsas de valores.

Questionado sobre a viabilidade da proposta, Zucman afirmou acreditar ser utópico que todos os países concordem com uma solução única, mas disse que não é necessário que todos concordem para que a taxação dos super-ricos seja implementada. “Não precisamos de um consenso global, é possível fazer avanços com uma coalização de acordos”.

Ele lembrou também a taxação mínima de 15% sobre os lucros de empresas multinacionais, proposta pela Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE); cerca de 140 países concordaram com a medida, embora no momento apenas 35 a estejam implementando. 

Questionado sobre quando a taxação de grandes fortunas entraria em vigor, Zucman afirmou não haver um prazo, mas destacou que quanto mais rápido, melhor. O economista afirmou que a proposta sugerida por ele recebeu reações positivas, destacando que a secretária do Tesouro dos EUA, Janet Yellen, mencionou que o governo Biden teria projeto semelhante. “Está claro que há espaço em países-chaves, como os EUA, para ideias como esta. A França também é fortemente favorável”.

Ganhador da medalha John Bates Clark de 2023, a segunda mais importante no campo da Economia, atrás apenas do prêmio Nobel, e autor de livros de impacto como “A Riqueza Oculta das Nações”, Zucman afirmou que está trabalhando em um estudo, a pedido do ministro Haddad, sobre questões como que destino dar aos recursos obtidos com a possível taxação dos super-ricos.