DESENVOLVIMENTO

Desigualdades no acesso à água e saneamento são um risco global, defendem especialistas

Evento paralelo realizado pelo GT de Desenvolvimento do G20 delineou estratégias otimistas para enfrentar a crise global de saneamento, destacando a importância da conexão com os impactos das mudanças climáticas, e a necessidade de integração financeira e inovações tecnológicas para garantir esses direitos.

17/03/2024 15:20 - Modificado há 2 meses
Dados do Fundo de Saneamento e Higiene das Nações Unidas (SHF) dão conta que 3,6 bilhões de pessoas no mundo não podem usar o banheiro de forma higiénica e segura no mundo | Foto: Marcello Casal Jr/Agência Brasil
Dados do Fundo de Saneamento e Higiene das Nações Unidas (SHF) dão conta que 3,6 bilhões de pessoas no mundo não podem usar o banheiro de forma higiénica e segura no mundo | Foto: Marcello Casal Jr/Agência Brasil

Especialistas defenderam o acesso à água e ao saneamento básico como fundamentais para enfrentamento à pobreza e a redução das desigualdades no mundo, neste domingo, 17/3, em Brasília. O evento paralelo ao fórum foi realizado pelo Grupo de Trabalho de Desenvolvimento do G20 e contou com a participação de representantes dos países-membros do G20, de organizações internacionais e acadêmicos. 

Joanna Esteves Mills, oficial técnica sobre Água, Saneamento, Higiene e Saúde da Organização Mundial da Saúde (OMS), posicionou o tema como um assunto global que é agravado pelas mudanças climáticas, os processos de urbanização das cidades e os recentes conflitos. Mills deu exemplos desses efeitos pelo mundo, por exemplo, no caso de doenças erradicadas há anos e que retornaram a atenção global.

“Vetores como estes prosperam em áreas urbanas onde o abastecimento de água e saneamento inadequados, a má gestão de águas e dos resíduos sólidos proporcionam condições de reprodução favoráveis. Outra tendência global que agrava os efeitos das desigualdades no acesso à água e saneamento sobre a pobreza são as emergências de saúde. Na última década, assistimos a um aumento constante nos surtos de doenças, com um crescimento médio anual de 6,9%” explicou. 

O diretor do Banco de Desenvolvimento da América Latina e Caribe (CAF), Franz Rojas, apresentou um aumento de 65% em investimentos da instituições para ampliar o acesso à água e ao saneamento na região, Rojas destacou que esses esforços não podem ser exclusivos de governos ou instituições financeiras, mas que precisam de aportes de recursos privados e coordenação para garantir direitos universais e combater as desigualdades.

“Sabemos que a água não está disponível nas residências para meninas e mulheres. Quando promovemos o acesso à água e ao saneamento, promovemos a igualdade e elas podem ter mais acesso às escolas, à educação, e também a ter melhores empregos. Entendemos este continuum de água com educação e empregos. Por isso o saneamento e a água são importantes”, defendeu o banqueiro. 

Sobre investimentos e economia no setor, Dominic O’Neill, diretor executivo do Fundo de Saneamento e Higiene das Nações Unidas (SHF), indicou que, todos os dias, 3,6 bilhões de pessoas no mundo não conseguem usar o banheiro de forma higiénica e segura, gerando impactos à saúde, à educação, ao bem estar e ao meio ambiente, sendo “também uma oportunidade perdida para as pessoas, os países, as economias e o planeta”, disse. O’Neill considerou a situação um desafio, mas apresentou soluções otimistas para a questão.

“Podemos alcançar a integração financeira para realizar investimentos públicos e privados de forma mais eficaz, criar novos modelos financeiros que incluam todo o valor económico e social de ter acesso a saneamento, higiene e saúde menstrual geridos de forma segura. Podemos também garantir que o saneamento seja incluído nos planos de financiamento climático, tanto na mitigação como na adaptação. Os financiadores, incluindo os bancos multilaterais, precisam de trazer inovações financeiras”, listou Dominic. 

Experiência Brasileira 

Os especialistas brasileiros apresentaram informações sobre a implementação de políticas públicas para ampliar o acesso à água e ao saneamento básico no Brasil e levaram informações sobre os planos do governo, possibilidade de investimentos e também de parcerias com o setor privado. O objetivo foi revelar os desafios para avançar nesta agenda em  um país com dimensões continentais e políticas que podem ser replicadas pelos países-membros do G20. 

Para Celeste Badaró, coordenadora do GT de Desenvolvimento, eventos como este são uma forma de aprofundar discussões importantes em andamento no grupo de trabalho, junto a representantes de organizações internacionais, do governo brasileiro e das nações do G20, da sociedade civil e da academia.

“O Brasil é um país que já avançou bastante no acesso ao ao saneamento básico, mas ainda temos muitos desafios, bem como todos os países do G20. Atualmente, só oito países do mundo têm acesso universal ao saneamento básico, nenhum deles é membro do G20. Então, todos o grupo têm dever de casa para fazerl. Vamos conseguir engajar todos os membros e conseguir melhorar esse acesso”, salientou a diplomata.

Marcela Ayub, coordenadora da Superintendência de Água e Estudos Socioeconômicos da Agência Nacional de Águas e Saneamento Básico do Brasil (ANA), apresentou estatísticas nacionais utilizadas para o monitoramento das metas e indicadores do Objetivo de Desenvolvimento Sustentável (ODS) 6 - Águas e Saneamento. Ayub destacou que os avanços do país nas políticas públicas do setor renderam uma indicação da ONU como caso de sucesso na promoção do acesso universal à água e ao saneamento básico. A especialista contou como a crise sanitária da Covid-19 impactou a coleta de dados e, possivelmente, novos avanços. 

De acordo com o Marcelo Chaves Moreira, coordenador de Cooperação Técnica e Estrutura de Saneamento do Ministério das Cidades, 65% dos domicílios no país têm acesso à água e saneamento. Todavia, Moreira explicou que, na área rural, os índices são menores e impõem desafios para o investimento estratégico para ampliação da rede de água e esgoto nessas localidades. O coordenador indica o fortalecimento de políticas públicas, por meio de arranjos entre os estados e municípios para ampliar o acesso da população a esses direitos. 

Pelo UNICEF (Fundo das Nações Unidas para a Infância), Rodrigo Matias Resende, oficial de Água, Saneamento e Higiene, apresentou o trabalho da agência para apoiar os territórios mais vulneráveis do país, especialmente em comunidades indígenas e comunidades tradicionais, nos temas de saneamento educação, práticas de higiene e fortalecimento das capacidades dos territórios amazônicos e do semiárido brasileiro , com foco no fortalecimento da agenda global de acesso à água e saneamento. “Temos a oportunidade no G20, com a presidência do governo Brasileiro, de avançar no tema de saneamento como uma agenda global”, salientou. 

O acadêmico Anderson Miranda de Souza, da Universidade Federal do Vale do São Francisco, contou a experiência da instituição com projetos de saneamento, acesso à água, educação ambiental e tecnologia, com foco na área rural nos estados do Ceará e Bahia, localizadas na região Nordeste do país. “A academia tem um papel importante para implementar as ações estruturantes no plano de saneamento rural . Recursos investidos em saneamento é redução de recursos investidos em saúde pública, isso que temos visto com a experiência nessas políticas”, pontuou.

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